
Há quem diga que depois dos 50 anos não vale mais a pena começar a praticar atividade física: “já passou da minha época”. Mas a biologia e a epidemiologia mostram o contrário. Mesmo após décadas de inatividade, iniciar exercícios nessa fase pode mudar — para melhor — o destino de nosso corpo e mente.
Vivemos em um país que envelhece rapidamente. Projeções do IBGE indicam que, em menos de 15 anos, um em cada três brasileiros terá mais de 50 anos. Atualmente, mais da metade desse grupo é sedentária. No mundo, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), 31% dos adultos não atingem o mínimo de atividade física recomendado. Entre os idosos, esse número chega a 50%. O resultado é o aumento expressivo de doenças como hipertensão, diabetes tipo 2, obesidade, osteoartrite, declínio funcional e depressão.
A boa notícia é que nunca é tarde para mudar. Estudos recentes do JAMA Network Open e do British Journal of Sports Medicine mostram que pessoas sedentárias que iniciam atividade física após os 50 têm até 35% menos risco de morte por todas as causas. Também se observam melhorias substanciais na pressão arterial, nos níveis de glicose e colesterol, no sono, na memória, no humor e na autonomia funcional.
A ciência explica: o exercício físico atua sobre quase todos os sistemas do organismo. Reduz a inflamação crônica de baixo grau, melhora a sensibilidade à insulina, aumenta a densidade mineral óssea e preserva a massa muscular — um fator essencial para evitar quedas e hospitalizações prolongadas.
Há evidências substanciais na literatura médica que apoiam o início de exercícios físicos após os 50, mesmo em indivíduos que foram sedentários durante toda a vida.
O estudo de Manning et al. (2024) destaca que adultos mais velhos que iniciaram um programa de exercícios supervisionados apresentaram melhorias significativas na função física, enquanto aqueles que permaneceram sedentários experimentaram declínios relacionados à idade. A revisão sistemática de Northey et al. (2018) reforça que o exercício físico melhora a função cognitiva em adultos com mais de 50 anos, independentemente do estado cognitivo inicial. Recomenda-se que os exercícios incluam componentes aeróbicos e de resistência de intensidade moderada.
A OMS recomenda que adultos com mais de 50 anos façam de 150 a 300 minutos por semana de atividade aeróbica moderada ou de 75 a 150 minutos vigorosa, além de fortalecimento muscular em dois ou mais dias por semana. Após os 65 anos, exercícios de equilíbrio e coordenação devem ser incorporados.
Como médica e professora da Faculdade de Medicina da USP, vejo diariamente o impacto positivo dessas mudanças. Já atendi pacientes que chegaram exaustos, limitados por dores, baixa autoestima e insegurança. Após iniciarem caminhadas orientadas, sessões de fortalecimento com fisioterapeuta e pequenas metas semanais, não só melhoraram seus parâmetros clínicos como voltaram a sorrir.
Por onde começar? Primeiro, com uma avaliação médica adequada, respeitando eventuais limitações. Depois, com atividades seguras e progressivas: caminhadas curtas, uso de pesos leves, alongamentos e técnicas de equilíbrio. O apoio de uma equipe multiprofissional aumenta a segurança e a motivação, especialmente no início, quando o corpo ainda resiste ao novo hábito.
Além dos ganhos físicos, há uma potente transformação emocional. O exercício devolve o senso de controle, disciplina e esperança. Combate a apatia e o isolamento. Traz de volta o prazer com o próprio corpo, agora não mais guiado por padrões estéticos, mas por liberdade e vitalidade. Em um momento em que discutimos os altos custos do envelhecimento e da saúde pública , é urgente lembrar que a solução pode estar nos passos dados todos os dias por ruas, parques e praças.
Fonte: O Globo