
O cenário demográfico do Brasil revela uma transição acelerada: o país, que por décadas se caracterizou por um perfil populacional majoritariamente jovem, agora enfrenta o desafio de acompanhar o avanço com um fenômeno claro de envelhecimento da população brasileira.
Este efeito, visível a olho nu nas ruas brasileiras, já é realidade: segundo o Censo 2022 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o país possui 22,1 milhões de pessoas com 65 anos ou mais, o equivalente a 10,9% da população total – um aumento de 57,4% em apenas 12 anos.
Esse processo exige não apenas adaptações econômicas e sociais, mas também uma nova forma de se fazer políticas públicas que precisam contemplar a qualidade de vida de quem envelhece.
Aqui vamos explorar o que significa envelhecer no Brasil hoje, como a desigualdade social agrava esse processo, o que o contexto global pode ensinar e quais são as ferramentas que temos hoje para envelhecer com, no mínimo, dignidade.
Como se define envelhecimento populacional
De forma resumida e olhando para um viés demográfico, o envelhecimento de uma sociedade pode ser definido como a mudança na composição etária de sua população, mais especificamente quando a proporção de pessoas mais velhas cresce em relação às de menor idade.
Este é o fenômeno do envelhecimento populacional que ocorre quando taxas de fecundidade caem, mortalidade reduz e a expectativa de vida sobe.
Afinal, o envelhecimento não se refere apenas ao fato de vivermos mais, mas também à mudança estrutural em como a população do Brasil se distribui por faixas etárias.
O Brasil vem passando por um processo de envelhecimento de sua população com o passar dos últimos anos, mas foi em 2022 que ele se concretizou, com uma pesquisa do IBGE afirmando que a idade mediana da população brasileira subiu de 29 anos, em 2010, para 35 anos, em 2022.
O cenário do envelhecimento no Brasil
O Brasil já caminha para um perfil demográfico mais idoso e a pirâmide etária mostra como o país está mudando rapidamente:
Em 1985, o país tinha uma base larga – o que significa que tínhamos muitos jovens na população geral do país.
Projeções recentes indicam que, até 2070, cerca de 37,8 % da população poderá ter 60 anos ou mais, o que representaria aproximadamente 75,3 milhões de pessoas. Já a projeção para 2085 indica uma pirâmide quase invertida, com muito mais idosos do que crianças.
Algo que também significa que o envelhecimento da população brasileira será intenso, pressionando a previdência, a saúde, o mercado de trabalho e exigindo políticas públicas mais fortes e planejadas para sustentar uma sociedade com cada vez mais longevidade.
Em outras palavras: o envelhecimento da população brasileira já não é mais uma previsão futura distante. É a realidade do presente. E isso tem impacto direto em como o Estado e a sociedade devem se organizar para dar conta dessa mudança geracional.
O envelhecimento através do tempo
Historicamente, o perfil etário do Brasil era jovem: em 1980, apenas cerca de 4% da população tinha 65 anos ou mais.
Com a urbanização e a queda acelerada da fecundidade – que chegou a 1,55 filho por mulher em 2022, segundo o IBGE – o Brasil avançou rapidamente para um novo padrão demográfico. Essa mudança reduziu a base jovem da população e aproximou o país de níveis típicos de nações desenvolvidas.
Ao mesmo tempo, a expectativa de vida aumentou, atingindo 76,4 anos em 2023 e reforçando a velocidade dessa transição.
Em poucas décadas, o Brasil atravessou um processo que, em muitos outros países, levou gerações para se consolidar.
Mas a demografia do Brasil aponta que o crescimento populacional tende a se estagnar: segundo projeções do IBGE, a população brasileira deverá parar de crescer por volta de 2041, alcançando cerca de 220 milhões de habitantes.

Como a desigualdade social afeta o processo de envelhecimento
O envelhecimento da população brasileira não ocorre de forma orgânica: ele também interage com desigualdades profundas – como regionais, de classes sociais, gênero e raça.
Por exemplo, a expectativa de vida, condições de saúde, acesso a serviços e suporte social variam fortemente conforme o nível econômico e local geográfico do Brasil em que a pessoa se encontra.
É dessa forma que a desigualdade repercute na “idade fisiológica” ou “idade de vulnerabilidade”, como é chamada a terceira idade.
Em comunidades mais pobres, idosos podem enfrentar mais cedo os efeitos da fragilidade, das doenças crônicas, da falta de acesso a equipamentos de apoio ou de lazer, e da precariedade de redes de proteção.
Esse cenário faz com que o envelhecimento se torne processo de risco e não simplesmente a celebração da longevidade e da sabedoria, como deveria ser.
Quando políticas públicas são deficitárias ou concentradas nas regiões de menor vulnerabilidade, o envelhecimento populacional se torna sinônimo de aumento de precariedades, podendo resultar no abandono.
Exemplo disso é um levantamento da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) que afirmou: existem cerca de 23.693 idosos vivendo nas ruas em todo o país, número que representa quase 10% das pessoas nessa condição, e que aumentou sete vezes nos últimos dez anos.
É necessário compreender como o processo se insere em um contexto de desigualdades estruturais, que determinam se envelhecer significa ter segurança e autonomia ou simplesmente ser marginalizado.

O retrato de abandono de idosos no Brasil
O abandono de pessoas idosas no Brasil é uma realidade cada vez mais alarmante.
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania registrou que, entre janeiro e maio de 2023, foram cerca de 19.987 denúncias de abandono de idosos no país — um aumento de 855% em um ano se olharmos para os 2.092 casos no mesmo período em 2022.
Além do abandono, infelizmente também existem os casos de violência: no primeiro trimestre de 2023, foram registradas mais de 202 mil violações de direitos humanos contra pessoas idosas, segundo o ministério.
Para mitigar esse cenário de abandono e violência, é fundamental fortalecer as ferramentas já existentes de proteção à pessoa idosa, especialmente dentro do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
É no SUAS, por exemplo, que estão as principais ações de prevenção e enfrentamento:
- Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS): realizam o atendimento direto das violações de direitos, incluindo casos de abandono, negligência e violência.
- Centro de Referência de Assistência Social (CRAS): atuam na prevenção, promovendo o fortalecimento de vínculos familiares e ofertando serviços comunitários que reduzem o isolamento social.
- Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs): instituições públicas ou conveniadas que garantem acolhimento institucional para idosos em situação de risco.
Afinal, sem a expansão e o financiamento adequado dessa rede, somado ao que já falamos sobre a pirâmide etária estar ficando cada vez mais idosa, o problema tende a ficar cada vez mais perigoso para a população.

O que podemos aprender no contexto global
No nível internacional, o envelhecimento é uma das megatendências globais do século XXI.
Olhando para um recorte Latino, dados do Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA, na sigla em inglês) reforçam que a taxa de crescimento da faixa etária com mais de 60 anos na América Latina e Caribe teve um aumento de 3,77% – maior que a taxa esperada em nível mundial.
Mas a experiência de países com maiores taxas de longevidade mostra que não basta aumentar a expectativa de vida: é necessário garantir qualidade de vida durante os anos adicionais.
Na Europa, por exemplo, políticas de proteção ao idoso, redes de cuidados comunitários, financiamento de sistemas de pensão e inserção produtiva de pessoas mais velhas são consideradas padrões, algo trivial. Comum. Porque é assim que deveria ser.
Já na China, existe uma legislação conhecida como Lei de Proteção dos Direitos e Interesses dos Idosos, que determina que filhos adultos têm responsabilidade legal de visitar, cuidar e oferecer suporte financeiro aos pais idosos.
Além disso, o governo chinês tem ampliado redes de centros comunitários de cuidado, programas de convivência e iniciativas de “cidades amigas do idoso”, alinhadas às diretrizes da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Afinal, não deveria ser nada fora da curva pensar na qualidade de vida do idoso – sobretudo quando o tema já aparece na pauta pública brasileira. O problema é que, apesar de estar em debate, esse tópico raramente se converte em ações práticas que garantam dignidade e bem-estar para a população.

Políticas públicas a favor do envelhecimento
No Brasil, a resposta institucional ao envelhecimento da população brasileira já possui um caminho traçado.
A Lei 8.842/1994, por exemplo, instituiu a Política Nacional do Idoso, que tem como objetivo assegurar os direitos sociais da pessoa com 60 anos ou mais ao promover sua integração e participação efetiva na sociedade.
Mas quando falamos sobre políticas públicas específicas para essa população, o estatuto do idoso descrito na Lei nº 10.741/2003 foi o primeiro documento completo e garantidor de direitos às pessoas dessa categoria.
Essa lei, inclusive, inclui a regularização da prioridade no atendimento, gratuidade de transporte, medicamentos gratuitos, direito à saúde no Sistema Único de Saúde (SUS) e entre outros direitos que estão respaldados nesta legislação.
É dessa forma que entendemos como falar sobre a mudança na faixa etária da população brasileira é emergencial porque já está acontecendo, não é algo do futuro.
A pirâmide etária se estreita na base e se alarga no topo diante dos nossos olhos, e o país ainda não possui políticas públicas à altura desse ritmo acelerado de envelhecimento.
Até porque não foi por acaso que esse fenômeno foi tema do ENEM 2025, refletindo como o debate sobre o envelhecimento deixou de ser técnico e passou a ocupar o centro das discussões sociais e políticas.
Inclusive, essa situação revela os progressos e as diferenças sociais que caracterizam o nosso país.
A forma como se envelhece no Brasil ainda está ligada ao dinheiro, ao local onde se vive, à cor da pele e ao acesso a serviços do governo, mostrando como ter uma vida longa e confortável pode ser algo fácil para alguns e difícil para outros.
Como país, criamos leis importantes, como o Estatuto do Idoso e o Plano Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, mas elas só funcionam de verdade se tivermos dinheiro para investir, se fiscalizarmos e lutarmos contra o abandono e a violência.
O que precisamos fazer agora é garantir que essas leis sejam aplicadas no dia a dia, cuidando para que a saúde, o apoio social, a aposentadoria e as cidades sejam pensadas para pessoas de todas as idades.
Chegar à terceira idade não deveria ser motivo de preocupação ou dificuldades. É um direito de todos. E é responsabilidade do governo e da sociedade garantir que esse direito seja respeitado, com respeito, atenção e incluindo todos.
Se temas como o envelhecimento populacional revelam muito sobre a construção social do nosso país, essa pós amplia ainda mais esse olhar, ajudando você a compreender os processos históricos, políticos e estruturais que moldam o Brasil de hoje.
Fonte: ICL Notícias





