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“O envelhecimento não é só um desafio, é uma conquista social”

Os idosos que moram sozinhos têm menor conhecimento dos medicamentos que usam ou dos tratamentos que realizam – Foto: Freepik

Foram divulgados os resultados da pesquisa Pessoas Idosas que Moram Sozinhas: demandas para as políticas públicas, interinstitucional e multidisciplinar. O objetivo é debater sobre as necessidades sociais e de saúde da pessoa idosa no contexto do envelhecimento populacional brasileiro, além de contribuir na formulação de políticas públicas equânimes a essa população.

O professor Rodrigo Bonicenha, do Departamento de Saúde e Sociedade da Faculdade de Saúde Pública da USP, contextualiza o cenário da pesquisa e do envelhecimento populacional no Brasil. “O Brasil está passando por um acelerado processo de envelhecimento populacional em ritmos distintos pelas diferentes regiões do país, mas sem um devido preparo. Hoje, por exemplo, a população idosa no Estado de São Paulo é de 17,2%, mas espera-se que, em 2060, essa proporção chegue a 35%, uma mudança muito acelerada.”

“A feminização da velhice é outra característica do envelhecimento e não é uma novidade para quem estuda o assunto, as mulheres são a grande maioria das pessoas idosas ao redor do mundo. A partir dos oitenta anos, existem basicamente duas mulheres idosas para cada homem.”

A dinâmica da pesquisa

A pesquisa é sediada na Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo, ordenada pelo professor  Nivaldo Carneiro Júnior, e envolve também outras instituições, a Faculdade de Medicina do ABC, Faculdade de Medicina de Jundiaí, a Escola da Cidade, e a Escola de Artes, Ciências e Humanidades da USP. Além disso, conta com o apoio da Faculdade de Saúde Pública da USP e a Rede de Proteção e Defesa da Pessoa Idosa (RPDI).

A pesquisa surgiu para analisar determinantes de vulnerabilidade, identificando necessidades e demandas de pessoas idosas que moram sozinhas nas cidades de Jundiaí, Santo André e o centro de São Paulo. “É um estudo transversal, que trabalhou com dados qualitativos e quantitativos. Em termos quantitativos, foi feita, principalmente, uma análise dos dados do Censo do IBGE, de 2022, e de outro estudo chamado Estudo Longitudinal de Saúde do Idoso do Brasil, onde foi analisado esse recorte das pessoas idosas que moram sozinhas. Na parte qualitativa, formamos grupos focais, entrevistas, tanto com profissionais da rede de atenção intersetorial à pessoa idosa como também com os próprios idosos que moram sozinhos.”

Perfil desses idosos

Apesar da crescente população de idosos que moram sozinhos, esse grupo é pouco citado em documentos oficiais ou marcos legais analisados para a realização da pesquisa. “A proporção de pessoas idosas que vivem sozinhas varia de 16% a 18% da população idosa, ou seja, é um grupo muito relevante. E, em relação às mulheres, as que vivem sozinhas são de 70% a 72%, evidenciando ainda mais essa feminização da velhice.”

“Um outro dado relevante que surgiu nesta análise é que, apesar de tomarem muitos medicamentos, em geral, os idosos que moram sozinhos têm menor conhecimento dos medicamentos que usam ou dos tratamentos que realizam, em comparação a idosos que convivem com outras pessoas.” Ou seja, o convívio ajuda que entendam melhor o que está acontecendo com a saúde deles e sobre seus tratamentos. Além disso, esse grupo fica mais vulnerável ao desenvolvimento de deficiências físicas e encontra maior dificuldade para agendar consultas médicas, devido também à recente digitalização desses processos.

O papel do Estado e da sociedade

De acordo com o Estatuto da Pessoa Idosa, são três entes responsáveis pelas pessoas idosas: o Estado, a sociedade e a família. “Quando tratamos dos que moram sozinhos, o papel do Estado e da sociedade passa a ser mais evidente. O envelhecimento não é só um desafio, é uma conquista social, mas como ele acontece nesse ritmo acelerado, é preciso que a rede de atenção seja proporcionalmente expandida para sustentar essa população que está envelhecendo, além de considerar a heterogeneidade dos indivíduos.”

Bonicenha finaliza comentando as medidas necessárias para expandir essa rede de atenção. “A promoção de espaços de convívio social, disponíveis durante todo o dia e que possuam transportes, é uma primeira medida que pode ser efetivada. Além disso, a questão da moradia, como programas de locação social, outras políticas habitacionais e ofertas de crédito para a realização de adequações nos domicílios, são essenciais, assim como a adequação das próprias cidades para a presença de idosos. Por fim, é extremamente importante a participação dos próprios na elaboração de políticas públicas, elas não podem ser apenas usuárias, precisam ser participantes dessas formulações.”

Fonte: Jornal da USP