
A fila de pedidos ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) se aproxima de 4 milhões em maio, segundo dados do instituto levantados a pedido da reportagem. Ao todo, 3,906 milhões de segurados aguardam uma resposta do órgão a solicitações de aposentadoria, pensão, revisão, recurso e cumprimento de decisões judiciais. Com as demandas internas, a fila sobe para 6,1 milhões de pendências.
Queda no número de funcionários, falhas nos sistemas por conta da Dataprev (empresa de tecnologia do governo federal), resquícios de duas greves em 2024 -de servidores administrativos e peritos- e solicitações duplicadas seriam motivos da alta. Dos quase 4 milhões de pedidos, 2,6 milhões são solicitações iniciais, número considerado como a “fila oficial” do órgão.
Há ainda 715 mil pedidos de Seguro Defeso, benefício sazonal pago a pescadores artesanais durante o período em que a pesca é suspensa para preservação das espécies, chamado de defeso. O estoque inclui 285 mil pedidos de revisão, 208 mil recursos administrativos -que aguardam julgamento ou cumprimento de decisão pelo CRPS (Conselho de Recursos da Previdência Social)- e 136 mil cumprimentos de ações judiciais.
O instituto acumula também 2,243 milhões de processos relacionados a fluxos internos e procedimentos automáticos de manutenção de benefícios, dos quais 999 mil correspondem ao MOB (Monitoramento Operacional de Benefícios), programa responsável por identificar possíveis irregularidades e fraudes, e há outros 1,2 milhão referentes a atividades de manutenção dos benefícios ativos.
O QUE EXPLICARIA O TAMANHO DA FILA DO INSS?
Pedro Totti, presidente do SINNSP (Sindicato dos Trabalhadores do Seguro Social e Previdência Social no Estado de São Paulo), afirma que a fila do INSS é resultado de um acúmulo de tarefas após greves de servidores realizadas em 2024, aposentadorias de um número expressivo de funcionários nos últimos anos e falhas constantes nos sistemas de tecnologia, que são gerenciados pela Dataprev.
“O que está acontecendo é que você tem uma demanda alta que entra, e a resolução dessa demanda é menor, você vai criando estoque em cima de estoque”, diz. Segundo o sindicalista, o número de pedidos iniciais que entram por mês está em torno de 200 mil, mas há benefícios cuja análise está parada, diz ele, como o Seguro Defeso, que em seus cálculos se aproxima de 1 milhão de solicitações que não andaram.
Sobre a aposentadoria de servidores, diz que há hoje cerca de 18 mil funcionários do INSS, somando os que entraram por meio de novo concurso público realizado entre 2022 e 2023. Mas que esse número já chegou a 35 mil em anos anteriores. Para ele, o que houve foi um “desmonte” do instituto, já que a intenção de governos anteriores seria privatizar ao menos parte dos serviços ou mesmo utilizar a tecnologia para melhorar o andamento da fila, o que não está ocorrendo.
“Quando você se reporta para 2015, 2014, nós não tínhamos fila, tinha um número de servidores e foi investido na questão da informática. Mas vieram os governos Temer e Bolsonaro, o Ministério da Previdência deixou de existir e o nosso estoque de trabalho só cresceu”, diz.
O advogado especialista em direito previdenciário Washington Barbosa afirma que a explosão na fila de espera do INSS é consequência direta da falta de estrutura do órgão. Segundo ele, os servidores responsáveis por analisar os pedidos também são designados para outras tarefas, o que gera um acúmulo e, consequentemente, um maior tempo de espera na fila.
O especialista também chama atenção para o enfraquecimento do CRPS (Conselho de Recursos da Previdência), que considera uma instância essencial para a resolução de impasses administrativos. “Era um modelo rápido e barato. Hoje está sendo sucateado”, diz.
Em abril, a fila original do instituto atingiu a marca de 2,678 milhões de requerimentos. No mesmo mês de 2024, esse estoque era de 1,4 milhão; houve um aumento de 91%.
O QUE O INSS DIZ SOBRE A FILA?
Em nota, o INSS afirma que a fila oficial (2,562 milhões pedidos) contempla os requerimentos de benefícios previdenciários e assistenciais que aguardam análise inicial do órgão. Há prioridade de atendimento, neste caso, porque demora de mais de 45 dias leva ao pagamento de juros pelo órgão.
“Além disso, entram no fluxo de trabalho do instituto demandas internas, sazonais ou que dependem da avaliação ou posicionamento de outros órgãos”, diz a autarquia.
O instituto também afirma que “prioriza a transparência dos dados referentes aos requerimentos que impactam diretamente a concessão inicial de benefícios aos cidadãos”, que e seus formatos de divulgação são continuamente avaliados.
COMO POSSO AGILIZAR O MEU PEDIDO DE APOSENTADORIA?
Segundo a advogada Adriane Bramante, conselheira da OAB-SP e do IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), a primeira dica é se planejar bem antes mesmo de entrar com o pedido.
“O segurado precisa conferir se os vínculos empregatícios e salários de contribuição estão corretos”, diz. Se houver erro ou ausência de documentos, o processo pode travar e voltar para o início.
Outro passo importante é usar a ouvidoria, por meio do aplicativo ou site Meu INSS, se o pedido não tiver resposta após três meses. “Em geral, oriento aguardar 90 dias. Se nada acontecer, faz-se uma reclamação formal. Passados seis meses sem resposta, já é cabível um mandado de segurança”, explica Adriane. O mandado de segurança é uma das principais alternativas legais para casos de atraso excessivo, como explica o advogado Rômulo Saraiva, especialista em direito previdenciário.
“Se há lei que fixe o prazo para resposta administrativa, o trabalhador não deve ser responsabilizado pela desorganização do INSS, sobretudo a deficiência em contratar mais servidores”, diz.
Washington Barbosa reforça que muitos atrasos são provocados por erros no início do processo. “Quando o pedido é mal instruído, o INSS emite uma carta de exigência e o segurado volta para o fim da fila. É como cair na casa ‘volte ao início’ do jogo de tabuleiro”, afirma.
Por isso, ele recomenda buscar assessoria especializada desde o início, mesmo que a entrada seja feita pelo próprio segurado.
COMO O INSS ESTÁ DESTRAVANDO A FILA?
No último mês, o INSS e o Ministério da Previdência Social divulgaram que pagariam até R$ 17,1 mil para os servidores do órgão destravarem a fila de pedidos de aposentadoria, pensão e outros benefícios, e realizarem a revisão do BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Segundo o documento, é possível receber R$ 68 extra por cada tarefa, chegando aos R$ 17 mil. Para receber os valores, as regras são as mesmas do programa anterior para destravar filas: primeiro, é preciso cumprir a meta de trabalho mensal do servidor, e só depois dá para participar do programa, com a possibilidade de ganhar valores a mais. Quem não cumpre a primeira etapa, majorada pelo INSS, não recebe.
O QUE DIZ A DATAPREV DIZ SOBRE AS FALHAS?
Em nota enviada à reportagem, a Dataprev afirma que, ao longo de 2024, a empresa modernizou os sistemas utilizados pelos servidores do INSS e os canais de atendimento ao cidadão, como o Meu INSS, que “passou a oferecer uma experiência mais ágil e personalizada aos usuários”.
Além disso, informa que, entre janeiro e fevereiro de 2025, ocorreu uma migração para o novo sistema de atendimento e para uma nova versão do Meu INSS, e a plataforma passou a contar com recursos para personalização de serviços conforme o perfil do cidadão e novos componentes de segurança.
“Não foram registrados episódios de indisponibilidade dos sistemas de atendimento do INSS em 2025. Episódios de lentidão e instabilidade ocorreram, de forma pontual, e foram solucionados”, afirma o texto.
Dados da Dataprev mostram que o Meu INSS teve, apenas em janeiro deste ano, mais de 100 milhões de acessos, número que superou a média mensal de 2024, de 70 milhões de acesso.
Fonte: Jornal O Tempo