Apesar da pressão da oposição, que explora o escândalo dos descontos fraudulentos de benefícios de aposentados do INSS no Congresso e nas redes sociais, o governo ensaia uma defesa cautelosa do ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, para evitar sua demissão.
Ontem, a crise dominou eventos do Dia do Trabalhador em São Paulo, que não tiveram a presença do presidente Lula. No lugar dele, os ministros do Trabalho, Luiz Marinho, e da Secretaria-Geral da Presidência, Marcio Macêdo, saíram em defesa de Lupi.
No entanto, Marinho desenhou um futuro incerto, atribuindo a permanência do ministro no governo à sua capacidade de corrigir o rumo no INSS, que teve o comando trocado por Lula, e ao que chamou de “avaliação política”.
Ele afirmou ontem que a crise “é um momento de oportunidade” para solucionar o problema revelado pelas investigações da Polícia Federal (PF) e da Controladoria-Geral da União (CGU): descontos em favor de entidades sindicais e associativas na folha de pagamentos do INSS que não foram autorizados pelos beneficiários e que somaram R$ 6,3 bilhões entre 2019 e 2024.
Mas por que, mesmo com a oposição explorando a crise do INSS nas redes sociais e com as assinaturas garantidas para a abertura de uma CPI, o presidente Lula evita demitir o ministro?
A explicação começa no fato de Lupi ser presidente licenciado do PDT, sigla com alta fidelidade na base do governo no Congresso. Lupi comanda o partido desde a morte de seu padrinho político e fundador da legenda, Leonel Brizola.
O PDT possui uma bancada de 17 deputados na Câmara. No Planalto há um receio de que a demissão de Lupi poderia fazer com que a legenda deixasse a base do governo e complicasse ainda mais a situação do governo Lula no Legislativo, que não é boa.
A defesa pública de Lupi feita ontem por Macêdo e Marinho segue a estratégia de defesa cautelosa do ministro adotada pelo governo enquanto a investigação da PF não aponta algo que o comprometa diretamente, para além do fato de ter admitido ter sabido das suspeitas e ter tido dificuldades de estancá-las.
O entendimento no governo é que, enquanto as investigações não apontarem envolvimento de Lupi, ele não será demitido. Nos bastidores, auxiliares de Lula admitem que Lupi se tornou um alvo de desconfiança e reconhecem o desgaste, mas avaliam que a pressão pode diminuir com o passar dos dias.
De qualquer forma, o pedetista já vem perdendo espaço. Enquanto ele defendia o então diretor do INSS, Alessandro Stefanutto, logo após a Operação Sem Desconto, da PF, Lula promoveu uma espécie de intervenção no INSS ao demitir o presidente do órgão e não dar a Lupi o direito de escolher o substituto.
O procurador Gilberto Waller Júnior, que ingressou no INSS como procurador em 1988 e já foi corregedor-geral do órgão, foi definido sem consulta a Lupi. De acordo com um ministro, Lula quis um técnico com experiência em gestão e auditoria.
A decisão envolveu os ministros Gleisi Hoffmann (Relações Institucionais), Jorge Messias (Advocacia-Geral da União), Vinicius de Carvalho (CGU) e Sidônio Palmeira (Comunicação Social). Lupi só foi avisado posteriormente por Gleisi.
Um integrante do governo próximo ao presidente avalia que a situação de Lupi é complicada, justamente pelo fato de o INSS ter sido avisado sobre as fraudes desde 2023. Para essa fonte, está provada a omissão, e o ideal seria que o PDT tomasse a iniciativa de indicar outro nome para a pasta. Mas Marinho afirmou ontem ver capacidade de Lupi de conter a sangria e reorganizar o INSS.
— A continuidade de um ministro (no cargo) muitas vezes passa pela avaliação política, não é simplesmente se ele tem culpa ou não tem. Você pode ter uma situação política de ausência de sustentabilidade ou de manutenção da sustentabilidade — afirmou Marinho, em conversa com jornalistas ao participar do ato do 1º de Maio de centrais sindicais na Zona Norte de São Paulo. — O ministro (Lupi) tem as ferramentas, agora, com a nova gestão do INSS, para poder tomar as decisões, fazer as correções de rota e dar garantia à sociedade de que o INSS é uma instituição séria. A partir daí é decisão eminentemente política, que cabe ao presidente.
‘Escândalos acontecem’
No mesmo evento, Macêdo fez uma defesa mais enfática de Lupi e frisou que as irregularidades começaram em 2019, no governo de Jair Bolsonaro, ecoando o discurso adotado pelo presidente Lula anteontem, ao tocar pela primeira vez no assunto em seu pronunciamento em rádio e TV por ocasião do Dia do Trabalhador.
O ministro afirmou que, até agora, “não tem nada que desabone a conduta” de Lupi e elogiou sua condução da crise “de forma transparente”, embora o titular da Previdência tenha admitido saber do problema e alegado dificuldades para deter as fraudes.
— Escândalos acontecem em qualquer lugar do mundo. A diferença é como se enfrenta. Nos regimes totalitários, se escondem. Nos regimes democráticos, vêm à tona — afirmou Macêdo, citando a escolha de Lula pelo procurador federal Gilberto Waller Júnior para comandar o INSS após a demissão de Alessandro Stefanutto, que havia sido escolhido por Lupi. — O presidente Lula tomou uma decisão rápida e séria. Afastou quem tinha que afastar, demitiu quem tinha que demitir, foi preso quem tinha que ser preso nessa fase. O processo vai continuar de forma transparente.
Questionado se o escândalo poderia afetar a relação do governo com entidades sindicais, Macêdo minimizou:
— Não atrapalha o curso democrático do governo nem a relação com entidades do país.
Fonte: O Globo