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Nossa democracia em perigo

Ato pela democracia em Brasília um ano após o 8 de Janeiro de 2023 — Foto: Cristiano Mariz / Agência O Globo

Depois de 15 dias de intervalo, volto para comentar o que vem acontecendo na política brasileira. Esse tema deve, sim, fazer parte de uma coluna sobre infância e saúde. Afinal, a política molda nosso presente e o futuro dos nossos filhos.

Estamos há dois anos e meio sob um governo democrático que tem implementado políticas públicas com impacto real na vida da população. O PIB cresceu acima das expectativas e o Brasil voltou ao grupo das 10 maiores economias do mundo. O desemprego caiu para 6,2%, a menor taxa desde 2012, e o salário mínimo se valorizou frente à inflação, que segue controlada. Mesmo a inflação dos alimentos é bem menor que a do governo anterior. O governo aprovou uma reforma tributária histórica, simplificando impostos, isentando a cesta básica e criando taxas seletivas sobre produtos nocivos.

Com o Bolsa Família reforçado e o pleno emprego, 8,7 milhões de pessoas saíram da pobreza e 3,1 milhões deixaram a extrema pobreza entre 2022 e 2023. A insegurança alimentar severa, que atingia 17,2 milhões em 2022, caiu para 2,5 milhões.

O SUS recupera políticas destruídas nos anos anteriores. O Mais Médicos dobrou de tamanho, houve avanço nas coberturas vacinais, o Farmácia Popular foi reativado com distribuição de fraldas e absorventes. Cirurgias eletivas aumentaram 37% e o SAMU foi modernizado.

Na educação, o Pé-de-Meia oferece bolsas a 4 milhões de estudantes do ensino médio. Um milhão está em escolas de educação integral. Professores recebem bolsas para atuar em locais remotos. O Programa de Alimentação Escolar teve aumento de orçamento, reduziu ultraprocessados e priorizou a produção local.

Houve queda expressiva no desmatamento em todos os nossos biomas. Há avanços em infraestrutura e energia. O Minha Casa, Minha Vida foi relançado, com isenção de prestações para os mais pobres. Os conselhos participativos foram reconstituídos.

Por mais que críticas sejam legítimas, os avanços são muitos, especialmente diante da destruição deixada pelo governo anterior. No entanto, estranhamente, a aprovação popular só piora: varia entre 28% e 40%; a desaprovação está entre 40% e 57%.

Muitos atribuem isso à inflação de alimentos ou a outros fatores, mas acredito que a máquina maciça de desinformação da extrema-direita na internet é a principal responsável. Vídeos no Instagram, Youtube e TikTok são produzidos com estratégias refinadas e financiamento internacional e depois distribuídos por WhatsApp e Telegram para milhões de pessoas. E a tendência é piorar com a chegada da IA, que facilita a produção de vídeos falsos e argumentações convincentes.

Medidas como a suposta “taxação do Pix” e escândalos como o dos descontos do INSS são distorcidos para culpar sempre o governo. O pânico moral segue sendo disseminado entre evangélicos. E os algoritmos reforçam bolhas de polarização, entregando apenas o que confirma crenças pré-existentes.

Enquanto isso, no Congresso, a extrema-direita bloqueia iniciativas de justiça tributária, como a taxação dos bilionários, aprova leis devastadoras para o meio ambiente e protege isenções fiscais de grandes empresas. O Executivo segue refém de um Congresso que domina o orçamento e impede políticas públicas mais amplas.

A comunicação do governo é fraca e mal adaptada ao universo digital. Nesse ritmo, corremos o risco de ver a extrema-direita voltar ao poder. Uma vez lá, o caminho pode ser o mesmo de países como Hungria, El Salvador, Turquia e EUA: mudanças estruturais no Judiciário, concentração de poder no Executivo, ataques à imprensa e universidades, discursos de ódio, mudança nas regras eleitorais, e instrumentalização de órgãos de Estado contra adversários. Tudo para garantir sua perpetuação.

Confesso que tenho medo. A destruição pode ser muito maior que entre 2019 e 2022. Os setores democráticos precisam reagir. E rápido.

Por Daniel Becker