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E as moças do caixa vão dando lugar a ‘terminais de autoatendimento’

Onde está o maldito código de barras? Vou girando a embalagem para todo lado e nada. Fazem de propósito, só pode ser. Depois de incontáveis rotações, encontro os diminutos tracinhos. A leitora da máquina, claro, não os reconhece. Tento limpar com a camisa, mas não funciona. Vou ter que digitar aquela interminável sequência de números para seguir com a compra. Como eles são tão pequenos quanto os traços, é uma operação demorada. Isso é um três ou um oito? Ao longe, a moça da caixa sorri. Quem ganha com isso?

Pouco a pouco vão desaparecendo as tais moças da caixa e surgindo mais e mais “terminais de autoatendimento”. Quem não tem o deslumbre da modernidade já sacou: você faz — de graça — o trabalho dos outros; e os outros, no caso as moças do caixa, são demitidos. Os preços? Só aumentam. Alguém se dá muito bem com essa situação, alguém que não somos nós, muito menos as moças do caixa. Alguém que não está preocupado nem comigo, nem com elas, mas sim com a liquidação do banco Master ou com o preço dos ternos Loro Piana. Me lembrou o poema do Cacaso: “Ficou moderno o Brasil/Ficou moderno o milagre/A água já não vira vinho/Vira direto vinagre”.

Alguns dirão que o autoatendimento é mais rápido, que diminui as filas — talvez, ao menos quando o código de barras é fácil de achar—, mas é que não é só uma questão de economia e eficiência: a fila educa as pessoas. Sim, meu caro leitor, não faça cara de espanto, é isso mesmo: onde mais você aprende a esperar a sua vez? Qual o método mais eficiente de exercitar a paciência? Não só: onde mais você aprende que dar “bom dia” e ser gentil não é só uma questão de boa educação, mas também facilita as coisas? Seja educado com as caixas, e elas terão toda a boa vontade do mundo para te ajudar a embalar as compras.

Nos bancos é a mesma coisa. Os caixas vão desaparecendo, e vamos todos para o autoatendimento. E tome senhas, códigos e digitais, com a gente cruzando os dedos para não fazer besteira e perder centenas ou milhares de reais. Mais uma vez: quem ganha com isso? Nós, os clientes, o caixa que foi demitido ou o banqueiro? Pois é.

Antes você chegava à agência com os seus boletos, cumprimentava os funcionários — que conhecia pelo nome —, jogava conversa fora com o gerente e ainda filava um cafezinho. “Ah, mas isso era no tempo dos bancos à manivela”, dirão os leitores mais dinâmicos e ocupados, “antes as pessoas tinham tempo para tudo”. Hoje dá para resolver tudo no celular: rápido, prático e sem dar bom dia pra ninguém.

O objetivo é economizar o máximo de tempo.

Aí está o mote desta coluna: o que fazemos com todo esse tempo ganho? Onde gastamos os minutos economizados não falando com os funcionários do banco, dando “bom dia” para a moça da caixa, puxando papo na fila? Confessem, meus dinâmicos e ocupados leitores: rolando a telinha do celular atrás de memes e vídeos inúteis, né? Ou então numa briga de zap tipo Lula x Bolsonaro com gente que você mal conhece, não?

Não à toa que essa garotada está cada vez mais impaciente e mal-educada: nunca encarou uma fila no banco ou deram “bom dia” para a caixa do supermercado. Tem coisas que não se aprende na tela do Chat GPT, só “perdendo tempo” na rua, encontrando pessoas. Não é três nem oito, é cinco, explica a sorridente moça. Ainda bem que ela ainda está lá.

Por Leo Aversa – fotógrafo e colunista.