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A população indígena e a distinção no tratamento aos idosos

Para o presidente do CEDEDIPI-MT, é fundamental reconhecer que os idosos merecem mais valorização em toda a sociedade

Idoso de comunidade indígena (Reprodução)

Diferentemente do que acontece na sociedade contemporânea, onde o envelhecimento muitas vezes é encarado como uma fase de isolamento e exclusão, as comunidades indígenas brasileiras valorizam profundamente seus idosos, reconhecendo-os como pilares essenciais da cultura, resistência e desenvolvimento. Essa valorização contrasta com a tendência de segregar os mais velhos do convívio social, do trabalho e de atividades inclusivas, demonstrando uma compreensão mais ampla e respeitosa da trajetória de vida e do legado das gerações mais velhas.

Segundo o Censo Demográfico de 2022 do IBGE, a população indígena no Brasil soma aproximadamente 1.693.535 pessoas, representando 0,83% do total nacional. A maioria, ou seja, 56,10%, possui menos de 30 anos, enquanto apenas 10,65% têm 60 anos ou mais — uma proporção menor do que os 15,81% observados na população geral do país. Essa realidade evidencia um perfil demográfico distinto, no qual a experiência e a sabedoria dos idosos assumem um papel central na preservação cultural e na condução do desenvolvimento.

No Território Indígena Ti Umutina, no município de Barra do Bugres (MT), os idosos desempenham papel fundamental nesse processo de valorização e desenvolvimento. São eles os artesãos experientes que confeccionam peças tradicionais, ensinando as novas gerações e garantindo a transmissão dos saberes ancestrais. Participam ativamente das feiras, onde comercializam suas criações, fortalecendo vínculos econômicos. Além das produções artesanais, eles preservam a memória oral e as histórias do povo Ti Umutina, atuando como guardiões da identidade cultural, contadores de histórias e portadores de tradição.

Nadir Naupe Spinelli, moradora da aldeia Massepô, presente nesse território, explica que as ações vão além da produção cultural. “Esses idosos participam de atividades cotidianas que mantêm viva a essência da comunidade, como esportes tradicionais e o preparo de alimentos típicos, como o peixe assado na tarimba. Ainda, têm protagonismo nas decisões das aldeias, nas reflexões sobre o impacto do turismo e na busca pelo equilíbrio entre desenvolvimento, preservação da cultura e sustentabilidade ambiental”, explicou Nadir.

De acordo com Isandir Rezende, presidente do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa de Mato Grosso (CEDEDIPI-MT), é fundamental reconhecer que os idosos merecem mais valorização e respeito em toda a sociedade. “É urgente que todos nós busquemos mudar essa realidade de desrespeito e invisibilidade, reconhecendo o valor dos idosos como protagonistas de nossas culturas. Precisamos fortalecer a sua presença, ouvir suas vozes e garantir que sejam respeitados, valorizados e incluídos em todas as esferas da sociedade”, refletiu Isandir.

Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) apontam que a discriminação contra as pessoas idosas é uma realidade mundial. Uma pesquisa sobre o tema revelou que 60% da população considera que os idosos não são respeitados. Essa realidade de desvalorização, que muitas vezes leva ao isolamento e à invisibilidade dos mais velhos, contrasta significativamente com a valorização presente nas comunidades indígenas, onde os idosos são considerados protagonistas de suas culturas.

A valorização da cultura na prática

Um exemplo emblemático dessa integração e respeito pelos idosos foi registrado na Etno Expo 2025, realizada nos dias 27 e 28 de junho na Aldeia Wazare, em Campo Novo do Parecis, Mato Grosso. Organizada pelo Sebrae/MT, em parceria com as prefeituras de Campo Novo do Parecis e Sapezal, a edição se consolidou como um marco na promoção do etnoturismo e na valorização das culturas indígenas. O evento reuniu oito comunidades indígenas, lideranças culturais e especialistas em turismo de base comunitária, recebendo mais de 400 visitantes que tiveram a oportunidade de vivenciar a diversidade dos povos originários.

Mais do que uma feira cultural, a Etno Expo 2025 foi uma celebração das tradições, resistências e identidades indígenas. Durante o evento, ocorreram oficinas de artesanato, apresentações artísticas, demonstrações de práticas alimentares tradicionais, rodas de conversa e a venda de produtos locais. Essas atividades destacaram o potencial do etnoturismo como ferramenta de geração de renda, além de promover trocas de conhecimentos e fortalecer as identidades culturais.

Para Nadir Naupe Spinelli, a feira ajuda a evidenciar a sabedoria, a experiência e a presença ativa dos idosos. Segundo ela, “Os idosos são essenciais para fortalecer essa jornada de valorização cultural e desenvolvimento sustentável. Na cultura indígena, o envelhecimento não é isolamento, mas uma fonte de poder, continuidade e esperança. Encontros como esse fortalecem nossas raízes e ampliam nossos campos de atuação. Hoje, povos como os Balatiponé e Rikbaktsa estão envolvidos na construção do etnoturismo, o que representa autonomia, valorização de saberes e o reconhecimento de que nossos idosos são peças fundamentais nesse processo.”

Isandir Rezende, presidente do CEDEDIPI-MT, e Nadir Naupe Spinelli, da aldeia Massepô

Durante o evento, o presidente do CEDEDIPI-MT, ressaltou que Etno Expo representa uma conquista importante na valorização da cultura indígena. “Tivemos a oportunidade de ver de perto a força dessas culturas e o valor que os idosos representam na manutenção de suas identidades. Ações como este reforçam a importância de integrar a valorização cultural à inclusão social e ao cuidado com nossos idosos”, concluiu.