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Governo estima alta de quase 18% com BPC em 2026 mesmo após revisão de gastos

Apesar dos esforços do governo para conter o avanço das despesas com o Benefício de Prestação Continuada (BPC), um tipo de aposentadoria de um salário mínimo paga a idosos pobres ou pessoas com deficiência, a projeção para 2026 aponta um aumento de quase 18% nos gastos com o programa, de acordo com as estimativas do Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) de 2026, enviado ao Congresso Nacional no último dia 15.

O programa foi incluído no anexo de revisão de gastos, que traz medidas adicionais para conter as despesas, mas permanece em trajetória de expansão orçamentária.

A alta expressiva chama atenção de analistas, com alerta para a possibilidade de subestimação das despesas e questionamento sobre a efetividade das medidas de contenção adotadas até o momento.

Para 2026, o governo estima gastar R$ 140,1 bilhões com o BPC, ante R$ 119,1 bilhões previstos para este ano, o que representa uma alta de quase 18% entre os exercícios. O economista Gabriel Leal de Barros, da ARX Investimentos, avalia, no entanto, que essa despesa está subestimada em torno de R$ 15 bilhões.

“O principal vetor do gasto com BPC e também previdenciário é o efeito preço, colateral do reajuste do salário mínimo. Além disso, tem ocorrido um avanço robusto da quantidade de beneficiários no BPC, sinal que nos parece até um certo descontrole da concessão”, pondera o economista.

A avaliação ainda leva em conta a frustração sistemática com o pente-fino (reavaliação de benefícios irregulares), que não entrega economia relevante.

Relatório da Warren Rena aponta a divergência em relação ao orçamento do BPC na casa de R$ 8 bilhões já em 2025 e para 2026 mais em linha, com diferença de R$ 700 milhões entre a estimativa dos economistas liderados por Felipe Salto e a do governo.

“O problema aqui é que se conjuga o aumento real do salário mínimo com o aumento das quantidades de benefícios, o que sobrepuja o aumento do PIB, ainda mais com a desaceleração esperada para 2026.

O limite de 2,5% para a correção do salário mínimo será importante para conter a despesa no biênio 2025-2026, mas não o suficiente. Aliás, o limite não deverá surtir efeito de 2027 em diante”, diz o documento.

Trajetória de elevação

A elevação das despesas com o BPC projetada para 2026 mantém aproximadamente o mesmo ritmo de crescimento observado desde 2022.

Naquele ano, os gastos com o programa aumentaram 16,5% em relação ao exercício anterior, conforme dados do Tesouro Nacional.

Em 2023, a alta foi de 17,5%, e, em 2024, chegou a 19,9%. A partir de 2027, porém, o governo projeta uma desaceleração no crescimento das despesas: são estimadas altas de 8,14% em 2027, 9,37% em 2028 e 11,35% em 2029.

O movimento de elevação do gasto, a partir de 2022, coincide com as mudanças legislativas na regra de acesso do benefício, que impulsionaram pedidos – entre 2017 e 2021, o avanço anual desse gasto ficou abaixo dos 10%.

Ao destrinchar as concessões do BPC, que é pago como uma aposentadoria para idosos muito pobres e também para pessoas com deficiência, a constatação é de que a maior elevação se dá justamente para os pedidos obtidos na Justiça, como já mostrado.

De 2023 para 2024, por exemplo, as concessões administrativas cresceram 9%, ao passo que as judiciais aumentaram 22%, de acordo com dados do Visdata, do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).

Em 2025, esse ritmo permanece no mesmo patamar, com crescimento da concessão judicial para pessoas com deficiência crescendo 24%.

Revisão de gastos

A alta de gastos com BPC para o próximo ano chama ainda mais atenção por ocorrer justamente em um momento em que o governo busca intensificar a agenda de revisão de gastos.

Em 2023, o Congresso Nacional aprovou um projeto de lei de autoria do Executivo com alterações nas regras do programa, com o objetivo de conter o avanço das despesas diante da explosão no número de beneficiários.

A proposta original previa uma série de ajustes nas regras de acesso e revisão cadastral. O governo conseguiu aprovar a inclusão do código da Classificação Internacional de Doenças (CID) na avaliação de deficiência para pessoas com menos de 65 anos, redução no prazo de atualização do Cadastro Único para 24 meses, biometria obrigatória e a vedação de dedução de renda não prevista em lei.

O Congresso excluiu a possibilidade de que posse de patrimônio superior ao limite de isenção do Imposto de Renda fosse prova de que a pessoa poderia se sustentar.

Além disso, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou um trecho que exigia atestar deficiência de grau moderado ou grave, nos termos de regulamento, para a concessão administrativa ou judicial do benefício.

Após as mudanças no Congresso, a economia projetada em dois anos com os ajustes do BPC caiu pela metade, de R$ 4 bilhões para R$ 2 bilhões. O PLDO aponta que, em 2025, as revisões podem poupar R$ 2,7 bilhões.

A estimativa se concentra exclusivamente no resultado do pente-fino, considerando que mais de 500 mil benefícios poderão ser definitivamente cessados por meio da revisão cadastral.

Para reforçar o compromisso em frear o orçamento do programa, o governo incluiu os gastos do BPC no anexo da revisão de gastos previsto na LDO, juntamente com as despesas com Proagro e com benefícios previdenciários.

As medidas para conter os gastos do BPC têm potencial de economizar R$ 12,4 bilhões entre 2026 e 2029 apenas com a revisão cadastral bianual do benefício.

Pelas projeções, a expectativa é de que a revisão do BPC gere uma economia de apenas R$ 2 bilhões em 2026. O valor sobe para R$ 4,2 bilhões em 2027, chega a R$ 4,5 bilhões em 2028 e recua novamente para R$ 2 bilhões em 2029.

Esse procedimento consiste em avaliar se o beneficiário ainda se enquadra nos critérios de pagamento do programa e compreende a revisão da situação do Cadastro Único, verificação da renda e revisão biopsicossocial. A revisão dos beneficiários com cadastro desatualizado há mais de 24 meses foi implementada em 2024.

O secretário de Orçamento Federal, Clayton Montes, explicou que o aumento na projeção de economia com o benefício ao longo dos próximos anos tem a ver com a maturação das medidas já aprovadas pelo Congresso.

Ele disse ainda que é natural que haja uma revisão do programa a cada dois anos. “Para o ano que vem, naturalmente a revisão aconteceria”, reforçou.

Fonte: Estadão