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Gentileza: um remédio invisível com efeito positivo

Foto: Custódio Coimbra/Agência O Globo

Um gesto simples. Abrir a porta, oferecer ajuda com as sacolas, perguntar de verdade como alguém está e escutar. A gentileza pode parecer pequena, mas dentro dela cabem revoluções.

Você provavelmente já sentiu isso na pele: um elogio num dia difícil, um bilhete carinhoso no meio da rotina, uma palavra acolhedora num corredor apressado. Em um mundo ruidoso e impaciente, a gentileza vai além da boa educação. É uma forma de cuidado, com efeito real em quem recebe e em quem oferece.

E a ciência confirma isso. Estudos recentes mostram que comportamentos gentis, o que os pesquisadores chamam de ações pró-sociais, estão associados a um aumento consistente do bem-estar psicológico. Mais do que promover um prazer imediato, essas atitudes elevam o chamado bem-estar.

Isso significa que fazer o bem não apenas nos faz sentir bem. Também nos ajuda a encontrar sentido, a lembrar que fazemos parte de algo maior, e que somos capazes de causar impacto positivo no mundo. É um antídoto silencioso contra o cinismo, o individualismo e o esvaziamento emocional que tantas vezes nos cercam.

A força da gentileza não se limita ao emocional. Há também efeitos fisiológicos mensuráveis. Em um ensaio clínico conduzido nos Estados Unidos, pessoas que realizaram pequenos atos de gentileza diariamente como escrever bilhetes positivos ou ajudar um vizinho, apresentaram redução na ativação de genes ligados à resposta inflamatória ao estresse. Ou seja, o corpo responde à gentileza com mais equilíbrio, menos tensão e, possivelmente, até mais saúde. Essa resposta está associada a um padrão genômico chamado CTRA (Conserved Transcriptional Response to Adversity), cuja expressão excessiva tem relação com doenças crônicas e envelhecimento precoce.

Além disso, programas de intervenção social, como o KIND Challenge, realizados em diferentes países demonstraram que estimular ações gentis no cotidiano ajuda a diminuir sentimentos de solidão, ansiedade social e isolamento. E, de forma talvez ainda mais potente, reforçam os laços comunitários, melhoram a convivência em bairros e aumentam a sensação de segurança e acolhimento.

Muita gente que pratica gentileza subestima o impacto que provoca, achando que foi algo pequeno, quase irrelevante. Mas, para quem recebe, o gesto pode ser profundamente marcante. Até quem apenas presencia uma cena de bondade se beneficia. Estudos mostram que ver um ato gentil melhora o humor, renova a esperança nas pessoas e ameniza os efeitos de notícias ruins.

Curiosamente, os gestos mais potentes não são os grandiosos, e sim os espontâneos e cotidianos. Dizer “bom dia” com o olhar, lembrar o nome de alguém, elogiar com sinceridade, ouvir com atenção, ceder o lugar, agradecer de verdade. A gentileza se costura assim, nos detalhes do dia.

E o melhor é que ela não exige tempo, dinheiro nem esforço descomunal. Só uma mudança de disposição. Um desvio do automático. Um olhar que enxerga além de si. Ela é especialmente poderosa quando surge sem plateia, sem obrigação, no gesto espontâneo de quem poderia ignorar, mas escolhe acolher. Em um mundo autocentrado, a gentileza vira ponto de luz. E, como toda luz no escuro, chama atenção. É impossível não notar e não se sentir um pouco melhor.

Há quem diga que o mundo anda insuportável, agressivo, acelerado demais. Talvez esteja mesmo. Mas é justamente aí que a gentileza se torna ainda mais necessária. Porque ela quebra o ciclo. Porque ela interrompe a lógica da indiferença. Porque ela devolve humanidade às relações.

Por isso, se puder, pratique um gesto gentil hoje. Mesmo que não pareça necessário. Mesmo que ninguém esteja vendo. Aliás, especialmente nesses momentos. Como dizia o Profeta Gentileza, que coloriu o Rio: “gentileza gera gentileza.” E gera mesmo.

Fonte: O Globo